“Uma vez fiquei surpreso com uma
intervenção pesada e inapelável de Lacan. Tinha em análise uma jovem que, no
decorrer do trabalho, fez uma transferência erótica comigo; minha presença
física dominava a cena: por exemplo, ela respirava a fumaça de meu charuto com
avidez, dizendo quanto ela gostaria de ser essa fumaça que eu respirava e
entrar dentro de mim. Lacan cortou a sessão e me disse: “Isso não é psicanálise”.
Não esperava uma intervenção dessas, porque achava que era o efeito de uma
transferência passional, mas superável. Nos tempos que se seguiram, tentei
corrigir a situação e interpretar essa transferência erótica, atenuá-la e
corrigir a situação, mas não adiantou; a paciente dava o tom erótico a cada um
de meus gestos. Enquanto eu contava para Lacan o que acontecia na relação
transferencial, Lacan se levantou e me disse: “É preciso acabar com essa
analise, até logo, meu caro”. Sempre esperei conseguir fazer a paciente voltar
a uma relação transferencial normal, ou seja, deserotizada. Mas a intervenção
de Lacan era definitiva e inapelável. Foi só mais tarde que entendi a
oportunidade daquela decisão.”
In: HOUBBALLAH,
A. Supervisão com Lacan. In:
DIDIER-WEILL, A.; SAFOUAN, M. (orgs.) Trabalhando com
Lacan: na
análise, na supervisão, nos seminários. Rio de Janeiro, Zahar, 2009. p. 44-50.
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