“Um dia fui
obrigado a constatar (foi bem no começo de meu tratamento) que me era muito
penoso pagar o que ele pedia. O que ele cobrava não era nem abusivo nem
excessivo, mas, considerando meus recursos, era uma enormidade. Por isso, em
geral, não ficava chateado quando ele saía de férias, pois ele só retornava no
dia 15 de setembro! Eu começava, então, no dia 1º. de setembro, a trabalhar
para ter como lhe parar. Ora, num ano, ele voltou no dia 1º. de setembro,
embora tivesse me dito que retornaria no dia 15, e fiquei sabendo por vários
companheiros de jogo, com quem dividia a mesma sala de espera, que ele tinha
voltado no dia 1º. e tinha ligado para alguns pacientes seus, mas... não para
mim! Não posso nem falar do ciúme que se apossou de mim – sem motivo,
evidentemente; eu então segurei as pontas até encontrar uma de minhas colegas
na sala de espera, logo antes da minha sessão, que me expressou seu júbilo,
pois Lacan tinha lhe telefonado já no dia 1º. de setembro! Diante disso não
dava para escapar! Mal deitei, disse-lhe: ‘Veja o que acabei de saber e,
digo-lhe com todas as letras, estou extremamente enciumado!” Ao que ele
respondeu: “O senhor está enciumado? Bem, nesse caso, o senhor me pagará todas
as sessões que deveria ter feito se eu tivesse lhe telefonado no dia 1º.’”
In: WINTER, J. P.
“Tiradas” de Lacan? In:
DIDIER-WEILL, A.; SAFOUAN, M. (orgs.) Trabalhando
com Lacan: na análise, na supervisão, nos seminários. Rio de
Janeiro, Zahar, 2009. p. 134-143.