CONFERENCIA
METODISTA 30-NOVEMBRO-2013
AFINAL,
O QUE É E COMO TRABALHA UM PSICANALISTA LACANIANO?
Leandro
Alves Rodrigues dos Santos: psicanalista, psicólogo, Doutor em Psicologia
Clínica (USP) e pós doutorando em Psicologia Social (PUC), membro da Escola de
Psicanálise dos Fóruns do Campo Lacaniano-Brasil e do Fórum do Campo
Lacaniano-SP.
Eu sou freudiano, se vocês quiserem sejam lacanianos...
Jacques Lacan, em
Caracas, 1980.
Há uma ironia presente no
título dessa conferência, esse “o que é”, ao invés de “quem é”. Naturalmente
isso não se deu de forma gratuita quando da elaboração desse pequeno texto que
visa modestamente explicitar ao interessado as possíveis temáticas que serão
abordadas e problematizadas neste evento que ocorrerá em breve.
Afinal, o “psicanalista
lacaniano” é um termo que, ao menos nos últimos vinte anos, têm chamado muito a
atenção das pessoas, quer seja pela originalidade nos manejos com os pacientes,
com a concepção ética que atravessa um tratamento, com as sutilezas da escuta e
das surpreendentes intervenções, com o rigor envolvido na formação, além de
certas subversões nos padrões até então estabelecidos que, não sem razão,
contribuem para a inflação de tal “personagem” [1] no
imaginário das pessoas, em especial aqueles que se embrenham no “mundo-psi”, se
assim podemos dizer.
Como ilustração, podemos
afirmar que muitos dos que ele conviveu também nos trazem interessantes
narrativas como, por exemplo, Melman (1998), quando dizia de Lacan e seu modo
de lidar com o tempo da sessão:
“Com
Lacan, as sessões nunca eram, só excepcionalmente, de 45 minutos. Ele às vezes
pedia ao analisando para voltar uma ou duas horas mais tarde, às vezes até uma
terceira ou uma quarta vez no dia. A duração de uma sessão podia estar ligada a
diferentes coisas. Primeiro, ao fato de que você podia não ter nada de
significativo a dizer: pode acontecer, nem sempre estamos ligados, o
inconsciente às vezes dorme, descansa, está em outro lugar. Assim, Lacan podia
parar a sessão porque não havia nada de especial que pudesse ser dito ali. Mas
também podia parar a sessão porque o corte dava toda a sua virtude, todo o seu
sentido ao que acabava de ser formulado. Havia, nele, um manejo dessa pontuação
que às vezes era pertinente, às vezes podia não ser, pois ele não estava seguro
de nunca se enganar. Em todo caso, era por razões teóricas muito claras que ele
se servia disso.” (p. 114)
Ou ainda Patrick Valas (2009), ao relatar a
respeito de sua ausência em certo número de sessões durante o começo de 1980,
sem uma justificativa adequada, quando pergunta a Lacan quanto lhe deve:
“Resposta:
- O senhor mesmo pode calcular. Estimei que, no fundo, a ausência era
responsabilidade sobretudo minha, bastava eu ter telefonado mais cedo.
Calculei: um mês = tantas sessões + tantas supervisões = 5 mil francos. - Não
tenho essa quantia comigo, posso lhe deixar um cheque caução, amanhã trago em
dinheiro? - Isso mesmo. Preenchi o cheque e lhe perguntei: - Ponho em nome de
quem? Berros de Lacan: - Glória, Glória! Ela irrompe imediatamente. - Ensine
Patrick a fazer um cheque. Ele, batendo os pés sem sair do lugar, eu,
voltando-me para ela: - Em nome de quem? Sem hesitar, ela disse: - Em nome do
Outro, com o O maiúsculo – e arrancou o cheque de mim nas barbas de Lacan.” (p.
131)
Até
mesmo nas supervisões, Lacan mantinha-se fiel aos seus pressupostos, como
podemos depreender de um breve testemunho de seu supervisionando, Adnan
Houbballah (2009):
“Depois,
ele perguntou o objetivo de minha visita e me explicou que começaríamos a
supervisão da próxima vez. “No começo”, disse ele, “serei pedagogo. Depois,
será outra coisa”. Vinte minutos após o início dessa primeira entrevista,
evoquei a questão do dinheiro. Expressei-lhe claramente minha situação: “Só
posso pagar 100 francos”. Lacan concorda. Soube depois que Lacan avaliava o
preço de uma sessão em função de seus efeitos no tratamento. Por exemplo, na
minha volta do Líbano – de onde vim arruinado, em 1975 -, só podia pagar 50
francos por minha supervisão. Ele aceitou, com a condição de voltar à antiga
tarifa quando a situação se normalizasse. A supervisão durou 12 anos.” (p. 46)
Esses poucos exemplos já
catalisam nossa atenção, desvelando um psicanalista que ousou fazer algo
diferente no cenário psicanalítico de sua época, com as questões que o interrogavam
e, desde então, influenciou significativamente gerações de analistas. Dessa
forma, fica no ar uma questão, agora renovada: o que é como trabalha o
psicanalista que se afina a esse modus
operandi criado e desenvolvido por Lacan, a partir do que ele mesmo chamou
de um “retorno a Freud”? Tentar responder a isso é a expectativa que atravessa
esta conferência. Bem vindos os que compartilharem de tal curiosidade!
Tópicos que serão
abordados:
·
O
psicanalista de orientação lacaniana... De onde vêm? Como chegou até isso?
Trata-se apenas de uma escolha consciente de linha teórica?
·
Como
os lacanianos pensam a formação de um psicanalista? No que difere de outras abordagens
teóricas, dentro e fora da Psicanálise?
·
Em
termos de crescimento, desde os anos setenta, como anda a cena lacaniana no
Brasil? Quais razões explicariam o “sucesso” dessa outra forma de pensar a
Psicanálise? “Lacan + brasileiros” redunda em algo novo, peculiar e afinado à
nossa forma de fazer laço?
·
O
que está por trás das mudanças promovidas por Lacan, alguma delas bastante
radicais, no manejo com o paciente, aliás, com o analisando?
·
Por
que o dinheiro é tomado de forma simbólica e manejado de maneira tão cuidadosa
pelo analista de orientação lacaniana?
·
Por
que o tempo é tomado de forma simbólica e manejado de maneira tão cuidadosa
pelo analista de orientação lacaniana?
·
Afinal,
o que quer dizer a tríade imaginário-simbólico-real, que tão repetidas vezes se
fazem presentes nos textos de lacanianos? E como isso afeta a direção de um
tratamento analítico?
·
Final
de análise é muito diferente de alta, interrupção ou abandono de um tratamento.
Como os lacanianos pensam esse aspecto e por que tanto interesse nos temas que
giram em torno do final de uma análise?
·
A
formação é mais difícil, mais lenta, menos pedagógica? Como se aproximar do
universo lacaniano, já que cursos de especialização atendem parcialmente essa
expectativa dos interessados?
·
O
que é uma Escola de Psicanálise? Qual a diferença em relação a uma associação
de psicanalistas, ou mesmo a uma sociedade?
·
O
que é um cartel? Como funciona? Há uma razão política por trás de tal proposta?
·
O
que é o passe? Como funciona essa ousada ideia de Lacan? Há uma razão política
por trás de tal aposta?
·
Lacanianos
são comumente criticados por outras linhas,escolas e abordagens teóricas,
dentro e fora da Psicanálise, não apenas no consultório, mas também em
trabalhos institucionais O que encobre essa animosidade? Há uma confusão de
línguas nesses momentos?
·
A
análise lacaniana pode ser considerada mais efetiva, mais direta e, portanto,
mais visceral? O que dizem os analisandos?
·
O
que significa pensar a lógica de uma análise em termos de questões da
linguagem, ao invés de algo do campo da saúde, bem estar ou algo assim?
·
O
que conceitos como Outro, gozo, Real, saber, e afins dizem da singularidade de
um campo teórico clinico como o lacaniano? Ainda somos freudianos?
Local:
Universidade Metodista de São Paulo – campus Planalto (Rua Dom Jaime de Barros
Câmara, 1000, Bairro Planalto – São Bernardo do Campo - SP)
Horário:
das 09h30min às 12h00min
Evento
público, aberto e gratuito
Inscrições:
basta preencher o formulário eletrônico, clicando no link https://eventioz.com.br/e/afinal-o-que-e-e-como-trabalha-um-psicanalista-lac
Vagas
limitadas
[1] Elizabeth Roudinesco
(2005), em seu trabalho A lista de Lacan.
Inventário das coisas desaparecidas, aborda este assunto, entre outros,
mostrando que Lacan apreciava investir o dinheiro em coisas que lhe
aprouvessem, características de seu modo de ser, muito afeitas ao personagem
por ele constituído: “Colecionador, fetichista, apaixonado por livros – e
principalmente por edições raras ou originais –, Lacan havia acumulado, ao
longo de toda sua vida, objetos de todos os tipos: quadros de mestres,
aquarelas,desenhos, esculturas, estatuetas arqueológicas, móveis preciosos,
roupas extravagantes confeccionadas de acordo com suas orientações: casacos de
pele, ternos em tecido raro, golas duras sem vira ou gola virada, nó de
gravata, sapatos feitos sob medida e em couros surpreendentes, e, enfim, moedas
de ouro – preferencialmente napoleões – aos quais se acrescentavam barras de
ouro, repartidas em cinco contas, em cinco bancos diferentes e em cofres
dispersos por Paris”.(p. 140)