BLOG QUE TRATA DE PSICANÁLISE

Um blog que diz de Freud, Lacan, Psicanálise, subjetividade, condição humana e outros assuntos afins, quase sempre muito interessantes...

quarta-feira, 27 de novembro de 2013

EVENTO: CONFERENCIA NA UMESP: AFINAL, O QUE É E COMO TRABALHA UM PSICANALISTA LACANIANO?


CONFERENCIA  METODISTA  30-NOVEMBRO-2013

AFINAL, O QUE É E COMO TRABALHA UM PSICANALISTA LACANIANO?

Leandro Alves Rodrigues dos Santos: psicanalista, psicólogo, Doutor em Psicologia Clínica (USP) e pós doutorando em Psicologia Social (PUC), membro da Escola de Psicanálise dos Fóruns do Campo Lacaniano-Brasil e do Fórum do Campo Lacaniano-SP.

 

Eu sou freudiano, se vocês quiserem sejam lacanianos...

Jacques Lacan, em Caracas, 1980.

 

Há uma ironia presente no título dessa conferência, esse “o que é”, ao invés de “quem é”. Naturalmente isso não se deu de forma gratuita quando da elaboração desse pequeno texto que visa modestamente explicitar ao interessado as possíveis temáticas que serão abordadas e problematizadas neste evento que ocorrerá em breve.

Afinal, o “psicanalista lacaniano” é um termo que, ao menos nos últimos vinte anos, têm chamado muito a atenção das pessoas, quer seja pela originalidade nos manejos com os pacientes, com a concepção ética que atravessa um tratamento, com as sutilezas da escuta e das surpreendentes intervenções, com o rigor envolvido na formação, além de certas subversões nos padrões até então estabelecidos que, não sem razão, contribuem para a inflação de tal “personagem” [1] no imaginário das pessoas, em especial aqueles que se embrenham no “mundo-psi”, se assim podemos dizer.

Como ilustração, podemos afirmar que muitos dos que ele conviveu também nos trazem interessantes narrativas como, por exemplo, Melman (1998), quando dizia de Lacan e seu modo de lidar com o tempo da sessão:

“Com Lacan, as sessões nunca eram, só excepcionalmente, de 45 minutos. Ele às vezes pedia ao analisando para voltar uma ou duas horas mais tarde, às vezes até uma terceira ou uma quarta vez no dia. A duração de uma sessão podia estar ligada a diferentes coisas. Primeiro, ao fato de que você podia não ter nada de significativo a dizer: pode acontecer, nem sempre estamos ligados, o inconsciente às vezes dorme, descansa, está em outro lugar. Assim, Lacan podia parar a sessão porque não havia nada de especial que pudesse ser dito ali. Mas também podia parar a sessão porque o corte dava toda a sua virtude, todo o seu sentido ao que acabava de ser formulado. Havia, nele, um manejo dessa pontuação que às vezes era pertinente, às vezes podia não ser, pois ele não estava seguro de nunca se enganar. Em todo caso, era por razões teóricas muito claras que ele se servia disso.” (p. 114)

Ou ainda Patrick Valas (2009), ao relatar a respeito de sua ausência em certo número de sessões durante o começo de 1980, sem uma justificativa adequada, quando pergunta a Lacan quanto lhe deve:

“Resposta: - O senhor mesmo pode calcular. Estimei que, no fundo, a ausência era responsabilidade sobretudo minha, bastava eu ter telefonado mais cedo. Calculei: um mês = tantas sessões + tantas supervisões = 5 mil francos. - Não tenho essa quantia comigo, posso lhe deixar um cheque caução, amanhã trago em dinheiro? - Isso mesmo. Preenchi o cheque e lhe perguntei: - Ponho em nome de quem? Berros de Lacan: - Glória, Glória! Ela irrompe imediatamente. - Ensine Patrick a fazer um cheque. Ele, batendo os pés sem sair do lugar, eu, voltando-me para ela: - Em nome de quem? Sem hesitar, ela disse: - Em nome do Outro, com o O maiúsculo – e arrancou o cheque de mim nas barbas de Lacan.” (p. 131)

Até mesmo nas supervisões, Lacan mantinha-se fiel aos seus pressupostos, como podemos depreender de um breve testemunho de seu supervisionando, Adnan Houbballah (2009):

“Depois, ele perguntou o objetivo de minha visita e me explicou que começaríamos a supervisão da próxima vez. “No começo”, disse ele, “serei pedagogo. Depois, será outra coisa”. Vinte minutos após o início dessa primeira entrevista, evoquei a questão do dinheiro. Expressei-lhe claramente minha situação: “Só posso pagar 100 francos”. Lacan concorda. Soube depois que Lacan avaliava o preço de uma sessão em função de seus efeitos no tratamento. Por exemplo, na minha volta do Líbano – de onde vim arruinado, em 1975 -, só podia pagar 50 francos por minha supervisão. Ele aceitou, com a condição de voltar à antiga tarifa quando a situação se normalizasse. A supervisão durou 12 anos.” (p. 46)

Esses poucos exemplos já catalisam nossa atenção, desvelando um psicanalista que ousou fazer algo diferente no cenário psicanalítico de sua época, com as questões que o interrogavam e, desde então, influenciou significativamente gerações de analistas. Dessa forma, fica no ar uma questão, agora renovada: o que é como trabalha o psicanalista que se afina a esse modus operandi criado e desenvolvido por Lacan, a partir do que ele mesmo chamou de um “retorno a Freud”? Tentar responder a isso é a expectativa que atravessa esta conferência. Bem vindos os que compartilharem de tal curiosidade!

 

Tópicos que serão abordados:

·         O psicanalista de orientação lacaniana... De onde vêm? Como chegou até isso? Trata-se apenas de uma escolha consciente de linha teórica?

·         Como os lacanianos pensam a formação de um psicanalista? No que difere de outras abordagens teóricas, dentro e fora da Psicanálise?

·         Em termos de crescimento, desde os anos setenta, como anda a cena lacaniana no Brasil? Quais razões explicariam o “sucesso” dessa outra forma de pensar a Psicanálise? “Lacan + brasileiros” redunda em algo novo, peculiar e afinado à nossa forma de fazer laço?

·         O que está por trás das mudanças promovidas por Lacan, alguma delas bastante radicais, no manejo com o paciente, aliás, com o analisando?

·         Por que o dinheiro é tomado de forma simbólica e manejado de maneira tão cuidadosa pelo analista de orientação lacaniana?

·         Por que o tempo é tomado de forma simbólica e manejado de maneira tão cuidadosa pelo analista de orientação lacaniana?

·         Afinal, o que quer dizer a tríade imaginário-simbólico-real, que tão repetidas vezes se fazem presentes nos textos de lacanianos? E como isso afeta a direção de um tratamento analítico?

·         Final de análise é muito diferente de alta, interrupção ou abandono de um tratamento. Como os lacanianos pensam esse aspecto e por que tanto interesse nos temas que giram em torno do final de uma análise?

·         A formação é mais difícil, mais lenta, menos pedagógica? Como se aproximar do universo lacaniano, já que cursos de especialização atendem parcialmente essa expectativa dos interessados?

·         O que é uma Escola de Psicanálise? Qual a diferença em relação a uma associação de psicanalistas, ou mesmo a uma sociedade?

·         O que é um cartel? Como funciona? Há uma razão política por trás de tal proposta?

·         O que é o passe? Como funciona essa ousada ideia de Lacan? Há uma razão política por trás de tal aposta?

·         Lacanianos são comumente criticados por outras linhas,escolas e abordagens teóricas, dentro e fora da Psicanálise, não apenas no consultório, mas também em trabalhos institucionais O que encobre essa animosidade? Há uma confusão de línguas nesses momentos?

·         A análise lacaniana pode ser considerada mais efetiva, mais direta e, portanto, mais visceral? O que dizem os analisandos?

·         O que significa pensar a lógica de uma análise em termos de questões da linguagem, ao invés de algo do campo da saúde, bem estar ou algo assim?

·         O que conceitos como Outro, gozo, Real, saber, e afins dizem da singularidade de um campo teórico clinico como o lacaniano? Ainda somos freudianos?

 

Local: Universidade Metodista de São Paulo – campus Planalto (Rua Dom Jaime de Barros Câmara, 1000, Bairro Planalto – São Bernardo do Campo - SP)

Horário: das 09h30min às 12h00min

Evento público, aberto e gratuito

Inscrições: basta preencher o formulário eletrônico, clicando no link https://eventioz.com.br/e/afinal-o-que-e-e-como-trabalha-um-psicanalista-lac

Vagas limitadas



[1] Elizabeth Roudinesco (2005), em seu trabalho A lista de Lacan. Inventário das coisas desaparecidas, aborda este assunto, entre outros, mostrando que Lacan apreciava investir o dinheiro em coisas que lhe aprouvessem, características de seu modo de ser, muito afeitas ao personagem por ele constituído: “Colecionador, fetichista, apaixonado por livros – e principalmente por edições raras ou originais –, Lacan havia acumulado, ao longo de toda sua vida, objetos de todos os tipos: quadros de mestres, aquarelas,desenhos, esculturas, estatuetas arqueológicas, móveis preciosos, roupas extravagantes confeccionadas de acordo com suas orientações: casacos de pele, ternos em tecido raro, golas duras sem vira ou gola virada, nó de gravata, sapatos feitos sob medida e em couros surpreendentes, e, enfim, moedas de ouro – preferencialmente napoleões – aos quais se acrescentavam barras de ouro, repartidas em cinco contas, em cinco bancos diferentes e em cofres dispersos por Paris”.(p. 140)

terça-feira, 19 de novembro de 2013

EVENTO: CONFERÊNCIA SOBRE O AMÓDIO: AMOR E ÓDIO NA RELAÇÃO TRANSFERENCIAL COM O ANALISTA


CONFERENCIA  METODISTA  23-NOVEMBRO-2013

SOBRE O AMÓDIO: AMOR E ÓDIO NA RELAÇÃO TRANSFERENCIAL COM O ANALISTA

 

Leandro Alves Rodrigues dos Santos: psicanalista, psicólogo, Doutor em Psicologia Clínica (USP) e pós doutorando em Psicologia Social (PUC), membro da Escola de Psicanálise dos Fóruns do Campo Lacaniano-Brasil e do Fórum do Campo Lacaniano-SP.

 

Um jovem russo rico que eu havia aceitado tratar por causa de uma paixão amorosa compulsiva declarou a mim depois da primeira sessão o seguinte, a guisa de transferência: ‘- Judeu ladrão, gostaria de te pegar por trás e cagar na tua cabeça’. Com seis anos de idade, o primeiro sintoma manifestou-se em xingamentos blasfemos contra Deus: porco, cão, etc. Quando ele via na rua três montes de estrume, sentia-se mal por causa da S[anta] Trindade, e procurava ansiosamente um quarto, para destruir a evocação.

Sigmund Freud, em carta endereçada a Ferenczi, em 13/02/1910.

 

A epígrafe acima é um belo exemplo do ódio que pode surgir na relação analítica, nesse caso especifico com o paciente Serguei Pankjeff, hoje conhecido como o Homem dos Lobos, termo cunhado por seu analista, Sigmund Freud. Dizer do amor que ocorre no tratamento analítico pode parecer mais fácil como, aliás, o próprio Freud (1912) deixa claro em seu já clássico Observações sobre o amor transferencial, quando diz da frequência com que se defrontava com casos nos quais “uma paciente demonstra, mediante indicações inequívocas, ou declara abertamente, que se enamorou, como qualquer outra mulher mortal poderia fazê-lo, do médico que a está analisando. Esta situação tem seus aspectos aflitivos e cômicos, bem como os sérios.”

Ou ainda, com boa dose de honestidade científica, ao relatar seus percalços com certas pacientes histéricas que por ele se diziam apaixonadas, permanecendo ou abandonando o tratamento:

“E certo dia tive a experiência que me indicou, sob a luz mais crua, o que eu há muito tinha suspeitado. Essa experiência ocorreu com uma de minhas pacientes mais dóceis, com a qual o hipnotismo me permitira obter os resultados mais maravilhosos e com quem estava comprometido a minorar os sofrimentos, fazendo remontar seus ataques de dor a suas origens. Certa ocasião, ao despertar, lançou os braços em torno do meu pescoço. A entrada inesperada de um empregado nos livrou de uma discussão penosa, mas a partir daquela ocasião houve um entendimento tácito de que o tratamento hipnótico devia ser interrompido. Fui bastante modesto em não atribuir o fato aos meus próprios atrativos pessoais irresistíveis, e senti que então havia apreendido a natureza do misterioso elemento que se achava em ação por trás do hipnotismo”. Freud (1925[1924], grifo nosso)

 

Não é sem surpresa que Lacan, em seu Seminário XX (Mais ainda) cunha a expressão presente no título dessa conferência, muito precisa e autoexplicativa, quando afirma “que, para vocês, eu gostaria de escrever hoje como a hainamoration, uma enamoração feita de ódio (haine) e de amor, um amódio, é o relevo que a Psicanálise soube introduzir para nele escrever a zona de sua experiência. Era, de sua parte, um testemunho de boa vontade.”

Dessa forma, fica no ar uma questão crucial: como se desenrola no tratamento analítico, durante e entre as sessões, esse tal amódio? Essa conferência tem essa ambição, tentar responder a partir das experiências cotidianas da clínica...

 

Tópicos que serão abordados:

·         O amor e o ódio sempre ocorrem num tratamento analítico? Sempre da mesma forma e sempre perceptível?

·         Quando falamos de amor entre um(a) paciente e um psicanalista, isso inclui a dimensão erótica?

·         Em termos transferenciais, o amor sempre ajuda e o ódio sempre atrapalha?

·         Por qual razão imaginamos mais facilmente a atração entre paciente e analista de sexos/gêneros diferentes? E entre ambos do mesmo sexo/gênero, isso por acaso não ocorre?

·         O ciúme pode ser considerado um desdobramento desse “fenômeno” chamado amódio?

·         No caso das analisandas, a possível inveja do pênis antecede a dificuldade de se entregar a uma experiência analítica, que inclui a incerteza de um amor(transferencial)?

·         No caso dos analisandos, a possível atração homossexual/heterossexual antecede a dificuldade de se entregar a uma experiência analítica, que inclui a incerteza de um amor(transferencial)?

·         Crianças em análise também passam por isso tudo? Da mesma forma? E o amódio da mãe? Ou dos pais?

·         Casais em tratamento, ou mesmo casal de pais, também são atravessados pelo amódio?

·         Encaminhamentos frequentes ou ausência completa de encaminhamentos de analisandos dizem de algo dessa ordem?

·         O amor é sempre infantil? O amódio comprova isso no dia-a-dia da clínica?

·         E do lado do analista? Trata-se simplesmente de questões de sua análise pessoal?

·         O amor está mudando atualmente? Mudarão os analisandos? Os analistas? As análises?

 

Local: Universidade Metodista de São Paulo – campus Planalto (Rua Dom Jaime de Barros Câmara, 1000, Bairro Planalto – São Bernardo do Campo - SP)

Horário: das 09:30 às 12:00

Evento público, aberto e gratuito

Inscrições: basta preencher o formulário eletrônico, clicando no link https://eventioz.com.br/e/inscricao-conferenciasobre-o-amodio-amor-e-odio-na

Vagas limitadas